DÍVIDA SOCIAL E
TRANSFERÊNCIA DE RENDA – PARTE II
Acácio de Carvalho
Janeiro de 2009
Jaboatão dos Guararapes-PE
Já
tratei das relações entre a dívida social brasileira e o principal programa de
transferência de renda do Governo Lula, o Bolsa Família. Enfatizei a
desigualdade brutal que vivenciamos no Brasil, no Nordeste e em Pernambuco;
destaquei os resultados do Bolsa Família na emancipação econômica de cidadãos
em situação de extrema pobreza (aqueles que vivem com menos de R$ 2,00 por
dia); pontuei as principais críticas ao programa (assistencialismo, fraudes,
descumprimento de condicionalidades e acomodação) e finalmente, expus as ações
do Governo Eduardo Campos para vencer esse desafio social. Esta semana, o tema
continua presente na mídia, em função de um gato (esse mesmo, um felino!!),
descoberto no interior de Mato Grosso do Sul como beneficiário do programa,
além da visita a Pernambuco da Secretária Nacional de Assistência Social, Ana
Lígia Gomes, ligada ao MDS. A visita teve o objetivo de relançar o Planseq,
plano setorial de qualificação para beneficiários do Bolsa Família. É hora de
refletir sobre algumas mudanças no programa, no intuito de aperfeiçoá-lo.
Pernambuco
tem pouco mais de 900 mil famílias ativas no Bolsa Família. Infelizmente, são quase
4 milhões de pernambucanos que atendem ao perfil do programa, o que representa
43% de nossa população. É menos que Piauí e Maranhão (48% da população), os
primeiros colocados em transferência de renda, e mais que Santa Catarina e São
Paulo (9 e 11%, respectivamente), estados que estão na outra ponta da linha, os
que recebem menos recursos do Governo Federal. A média nacional é 24% (11
milhões de famílias ou 44 milhões de brasileiros). Em Pernambuco, que está em
6º lugar nesse “ranking”, há municípios como Cumaru, onde dos 16 mil
habitantes, 14,8 mil são beneficiários da bolsa (91% da população) e Toritama,
que está entre os mais bem colocados do estado, com “apenas” 25% de
beneficiários.
A
lógica de emancipação econômica que o Governo Estadual vem adotando é a
seguinte: (1) Forte investimento na área de educação das gerações vindouras,
procurando oferecer uma melhoria na qualidade do ensino, através de aumento de
vagas para professores, plano de carreira, assinatura de jornais, compra de
computadores portáteis, fardamento, material didático, laboratórios,
recuperação de prédios, metas para todas as escolas, etc.; (2) Crescimento
econômico através da atração de investimentos estruturadores e desconcentração
desses investimentos, interiorizando a riqueza gerada, como o pólo de Suape, a
rota do jeans, a fruticultura do São Francisco, dentre outros; (3) Melhoria da
saúde no campo preventivo, com programas como o Mãe Coruja Pernambucana, para
combater a mortalidade materno-infantil, conscientização dos cidadãos, usando a
rede de agentes de saúde, realizando campanhas, etc.; (4) Qualificação dos
beneficiários atuais do Bolsa Família, com elevação de escolaridade, retirada
de documentos, capacitação em direitos humanos, treinamento profissional,
noções de empreendedorismo, economia solidária e associativismo, além de apoio
e consultoria após a qualificação, como no exemplo do Programa Pernambuco no
Batente.
A
conjunção favorável destes quatro eixos pode eliminar a pobreza extrema em
nosso estado no prazo de dez anos. Façamos as contas: cada centro de inclusão
produtiva PE no Batente custa R$ 260 mil/ano e atende de 200 a 320 famílias.
Isso dá em média R$ 1.000,00 por família ao ano. Então, o custo para treinar
todas as famílias beneficiárias de Pernambuco em cursos de qualificação com
duração de um ano, seria de R$ 900 milhões. Ora, esse valor é aproximadamente o
que o Governo Federal repassa para os beneficiários de Pernambuco no programa
Bolsa Família anualmente!!
É
impossível fazer todo esse esforço de uma vez, mas se dividirmos os
investimentos ao longo de 10 anos, espalhando 350 centros por todo o Estado, chegaremos
a números bastante razoáveis, contando com o empenho dos governos Federal,
Estadual e municipais. Para termos uma idéia, segundo dados da Secretaria de
Planejamento e Gestão, os recursos alocados no fundo estadual de combate à
pobreza são dessa magnitude, restaria direcionar parte deles para programas de
inclusão produtiva. O Governo Federal poderia incentivar estados e municípios
que combatam as fraudes no programa, e direcionar os recursos economizados para
a qualificação. Os municípios entrariam com a contrapartida habitual de 10 a
20%. Rapidamente, chegaríamos a R$ 90 milhões de investimentos. Outro dado
comparativo: Pernambuco teve em 2008 um dos melhores desempenhos do país em
criação de vagas, mais de 50 mil postos de trabalho e a Secretaria de Juventude
e Emprego investiu R$ 22 milhões para capacitar 30 mil pernambucanos. Parte
destes recursos podem ir para o perfil do usuário do Bolsa Família.
Por
outro lado, é preciso aperfeiçoar algumas coisas no programa: (1) a capacitação
deve passar a ser obrigatória e não voluntária, como ocorre hoje. Deve ser uma
das condicionalidades adotadas, além de saúde e educação. (2) Feita a capacitação,
a bolsa deve ser temporária, para combater a acomodação. Se não for feita a
inclusão produtiva no período da bolsa, ninguém seria abandonado, mas teria que
sofrer uma reavaliação para continuar no programa. Pode ser criado um sistema
de redução gradual do incentivo, por exemplo: nos dois primeiros anos, a bolsa
é integral, no terceiro cairia para 75% e no quarto para 50%. O quinto ano
seria o último do programa e a família só receberia 25% da bolsa. O importante
é que as pessoas não tivessem medo de perder o benefício. Os recursos
otimizados seriam revertidos na ampliação das capacitações. Cinco anos, com
assistência permanente do poder público e a colaboração do setor produtivo, é
um tempo razoável para emancipar economicamente uma família. Os profissionais
capacitados via Bolsa Família poderiam ter um incentivo na legislação
trabalhista, com flexibilização de alguns impostos para o empresário que
contratá-los.
No
próximo ano, teremos eleições presidenciais e o Programa Bolsa Família como forma
de minimizar a nossa dívida social estará em tela, presente no debate. Seja
qual for o presidente eleito, da base de sustentação do Governo ou não, será
impossível retroceder na política pública de transferência de renda, sob pena
de cometer suicídio eleitoral. O mérito do Presidente Lula em implantar uma
política dessa natureza para aqueles que estavam esquecidos, à margem da
sociedade consumista e incluí-los no rol das políticas públicas, jamais será
esquecido. Pensar em melhorias, com criatividade, é possível: 44 milhões de
brasileiros esperam por isso. Em dez anos podemos diminuir ainda mais a pobreza
extrema em nosso país. Pode ser que assim, com uma menor desigualdade social e
mais educação, tenhamos menos “gatos” no Bolsa Família...
Comentários
Postar um comentário